O governo federal enfrenta resistência na Câmara dos Deputados para avançar com a Medida Provisória (MP) que prevê aumento de impostos. A cúpula da Casa já comunicou ao Palácio do Planalto que a proposta não deve progredir no Congresso sem a apresentação de alternativas concretas para corte de despesas públicas.
O recado foi transmitido nesta semana, após a edição da MP pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na noite de quarta-feira (11). A medida enfrenta forte oposição de empresários e parlamentares, que cobram maior controle dos gastos públicos como condição para discutir o aumento da carga tributária.
Câmara cobra mais eficiência no controle fiscal
A insatisfação na Câmara se intensificou diante do que deputados classificam como baixa execução orçamentária por parte do governo, incluindo a liberação lenta de emendas parlamentares. Líderes da Casa apontam falhas de coordenação entre ministérios e alertam para a necessidade de mais agilidade na gestão orçamentária.
Além da resistência política, a proposta do governo enfrenta pressões de setores empresariais que pedem ao presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), que a MP seja desconsiderada. Desde antes da publicação oficial da medida, aliados de Motta já avaliavam que a proposta teria poucas chances de prosperar.
A estratégia articulada pelos deputados é segurar a tramitação da MP até que o governo apresente iniciativas efetivas de redução de despesas, ampliando o espaço fiscal e sinalizando compromisso com a sustentabilidade das contas públicas.
Restrição à compensação de créditos preocupa contribuintes
Um dos pontos mais criticados da MP é a limitação ao uso de créditos tributários para compensação de débitos com a Receita Federal. O Fisco argumenta que a medida é necessária para combater fraudes, mas especialistas tributários alertam que a restrição pode gerar insegurança jurídica e aumentar disputas no Judiciário.
Tributaristas apontam que a proposta fere direitos constitucionais dos contribuintes ao limitar a utilização de créditos legítimos. "Essa mudança deve gerar um grande volume de judicialização", avaliam advogados consultados.
Governo propõe corte de despesas para destravar a pauta
Na tentativa de viabilizar a tramitação da MP, o governo apresentou um pacote com cinco medidas voltadas para redução de gastos públicos. Entre elas, destaca-se a proposta de inclusão dos investimentos do programa Pé-de-Meia, voltado à permanência de alunos no ensino médio, no cálculo do piso constitucional de educação.
A medida, segundo técnicos da área econômica, cria uma folga de cerca de R$ 12 bilhões no orçamento de 2025. O governo considera essa ação essencial para atender à meta fiscal sem prejudicar programas sociais.
Integrantes do Executivo afirmam que o conjunto de medidas representa uma nova etapa no esforço de revisão de despesas públicas. A expectativa é que o Congresso aprove as propostas como parte do compromisso institucional com o equilíbrio fiscal.
Deputados cobram novas sinalizações
Mesmo após a apresentação das propostas, deputados seguem pressionando o governo por medidas mais robustas de corte de gastos. Durante reuniões com líderes parlamentares, o Palácio do Planalto ouviu pedidos para acelerar a definição de alternativas que reduzam despesas de forma estrutural.
Uma liderança do centrão afirmou que o governo terá um prazo informal de aproximadamente duas semanas para apresentar soluções adicionais. O período coincide com o esvaziamento natural do Congresso por conta do feriado da próxima semana e das festas juninas, especialmente no Nordeste.
Enquanto aguarda novas propostas do Executivo, a Câmara deve votar, já na segunda-feira (16), um requerimento de urgência para um projeto que visa revogar o decreto que elevou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O pedido de urgência foi interpretado como mais um sinal de pressão sobre o governo.
Governo critica movimentação da Câmara
O líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), criticou a articulação para acelerar a tramitação do projeto que pode derrubar o novo IOF. "Considero um erro e uma mensagem ruim para o país. Precisamos de união para enfrentar os desafios fiscais que garantem nosso crescimento econômico", publicou o parlamentar em suas redes sociais.
A movimentação da Câmara é vista, dentro do governo, como reflexo do descontentamento com a baixa execução das emendas parlamentares e do ambiente político mais tenso em ano pré-eleitoral.
Decisão do STF gera novo atrito com o Congresso
Outro fator que contribuiu para o agravamento da crise foi um despacho recente do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre a liberação de emendas. Parlamentares interpretaram a decisão como resultado de articulações do Executivo e aumentaram as críticas ao governo.
Em resposta, a ministra Gleisi Hoffmann, da Secretaria de Relações Institucionais, negou problemas na execução orçamentária e afirmou que o governo irá esclarecer os pontos levantados ao STF. Gleisi também garantiu que a liberação das emendas começará até o fim da semana.
Divergências sobre a condução política
Aliados do governo demonstraram desconforto com o tom adotado pelo presidente da Câmara, Hugo Motta, nas críticas ao Executivo. Um integrante da base governista avaliou que Motta tenta administrar pressões internas da Câmara, mas considerou que as declarações recentes "passaram do ponto".
Entre os apoiadores de Motta, há avaliação de que a postura adotada pelo presidente da Câmara tem gerado desgaste tanto com o governo quanto com o Congresso. Parlamentares próximos sugerem que o deputado precisa revisar a condução política para evitar maior isolamento.
Além disso, interlocutores apontam que houve falha de comunicação na entrevista coletiva após a reunião entre Congresso e Executivo, já que não ficou claro que não havia acordo formal com o governo sobre as medidas apresentadas.
Mercado financeiro acompanha cenário com cautela
No setor financeiro, analistas ouvidos sob condição de anonimato demonstraram frustração com o que consideram hesitação da Câmara em apoiar medidas de ajuste fiscal de longo prazo. O mercado avalia que a falta de sinalização concreta sobre cortes de despesas pode comprometer a credibilidade fiscal do governo.
A demora na tramitação da MP e as dificuldades políticas enfrentadas pelo Executivo reforçam a percepção de instabilidade no avanço da agenda econômica.
Com informações adaptadas da Folha de S. Paulo